quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Recursos Jurisdicionais em especial recursos ordinários - João Rocha


João Rocha (*)

Recursos jurisdicionais em especial recursos ordinários

Introdução

Este trabalho tem como finalidade analisar os recursos jurisdicionais, mais concretamente os recursos ordinários, e quais os procedimentos adotados pelo Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e a título subsidiário pelo Código de Processo Civil (CPC). 

Irão ser analisados os pressupostos conexos a estes recursos, tais como a legitimidade, os efeitos dos recursos, alegações, entre os demais que se encontram referidos no CPTA.



Recursos jurisdicionais: noção geral

Recurso é a possibilidade de as partes recorrerem a um tribunal de hierarquia superior por não concordarem com a decisão proferida por um tribunal hierarquicamente inferior.

Os recursos jurisdicionais estão previstos nos artigos 140º a 156º do CPTA, sem prejuízo do disposto no nº3 do artigo 140º do CPTA que enuncia que “os recursos das decisões proferidas pelos tribunais administrativos regem-se pelo disposto na lei processual civil, salvo o disposto no presente título”, título esse respeitante aos recursos jurisdicionais presente nos artigos 140º a 156º do CPTA. Com isto, quer dizer que se a matéria estiver regulada no CPTA, este prevalece em relação à lei processual civil.

A Constituição da República Portuguesa (CRP) não garante o direito à interposição de um recurso relativamente a todos os processos e a todas as decisões jurisdicionais, contemplando o recurso apenas para garantia de processo criminal, tal como decorre do seu artigo 32º nº1. Isto advoga, que o legislador dispõe de uma ampla margem de liberdade de conformação. A ideia de que são admitidos recursos jurisdicionais, não se consegue extrair do nº1 do artigo 20º da CRP, que assegura “o acesso ao Direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos” e nem do nº4 do artigo 268º da CRP que nos refere expressamente que os atos administrativos que lesem direitos e interesses legalmente protegidos podem ser alvo de impugnação ou até mesmo alvo de medidas cautelares, não invocando a possibilidade de recurso.

Pelo facto de a CRP não lhe aludir expressa e diretamente, o entendimento do Tribunal Constitucional (TC) tem sido o de que a previsão, a admissibilidade e a tramitação dos recursos jurisdicionais não é possível nos casos de duplo grau de jurisdição, pois o entendimento do TC é de que não se consegue extrair do artigo 20º nº1 da CRP e nem do artigo 268º nº4 da CRP.

Seguindo este entendimento do TC, basta verificar a epígrafe do CPTA dos “recursos jurisdicionais”, sendo, portanto, admitido o recurso, o que contraria um pouco essa posição.

Como espécies de recursos, temos os recursos ordinários que são a apelação e a revista, e os recursos extraordinários que são o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão, sendo que os recursos extraordinários não serão objeto de análise neste trabalho. 

Cumpre ainda referir, que as espécies de recursos são idênticas às enunciadas em processo civil (artigo 627º nº2 do CPC).

Temos como tribunais administrativos os tribunais de 1ª instância (Tribunais Administrativos de Círculo), de 2ª instância (Tribunais Centrais Administrativos) e o Supremo Tribunal Administrativo.

São tribunais de recurso jurisdicional os Tribunais Centrais Administrativos (TCA) e o Supremo Tribunal Administrativo (STA).

Cumpre, portanto, passar à análise da matéria relativa aos recursos ordinários.

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(*) João Rocha Nº 26482 


Legitimidade, prazos e efeitos da interposição de recursos  

A legitimidade encontra consagração legal no artigo 141º do CPTA. Segundo este artigo, pode interpor recurso quem na decisão jurisdicional tenha ficado vencido e para além do vencido por ainda interpor recurso o Ministério Público se a decisão violar “disposições ou princípios constitucionais ou legais”, pois o Ministério Público é o guardião da legalidade.

Este preceito merece considerações: em primeiro lugar a expressão “quem nela tenha ficado vencido” subentende a parte principal no processo.

São consideradas partes no processo os autores, os réus, os contrainteressados e ainda os que tenham intervindo na defesa do seu interesse sendo igual ao do autor ou do réu.

A parte vencida é aquela a quem a decisão não foi favorável.

A questão relativa à legitimidade tem sido entendida no sentido de que as decisões dos tribunais administrativos podem ser objeto de recurso por quem “não seja parte na causa ou seja apenas parte acessória”, desde que as decisões lhe causem direto e efetivo prejuízo1. Tem sido este o entendimento do STA desde 2011.

Ainda relativo à legitimidade há que realçar o disposto nos nº2 e nº3 do artigo 141º do CPTA, que consagram regras específicas que dizem respeito à legitimidade do autor, considerando-se o autor parte vencida em relação à parte dispositiva da sentença que tenha julgado improcedentes causas de invalidade alegadas pelo autor.

Estes dois números do artigo 141º do CPTA têm o efeito de qualificar o interesse em agir, podendo o autor ser parte vencida se todas as suas pretensões não tiverem procedência, parte vencida saliente-se, nas partes em que a sua procedência não vingou, podendo interpor recurso apenas quanto a essas partes que improcederam.

Relativamente aos efeitos do recurso, tal como decorre do artigo 143º do CPTA no seu nº1 refere que “os recursos ordinários têm efeito suspensivo da decisão recorrida”.

Segundo este nº1 infere-se pelo referido expressamente no artigo que, o efeito suspensivo é aplicável apenas aos recursos ordinários (recurso de apelação e recurso de revista), não se aplicando aos recursos extraordinários, no entanto, tem de se ter em consideração a 1ª parte desse número, salvo se lei especial estabelecer em sentido diverso.

A lei reconhece efeito devolutivo aos recursos que estejam abrangidos pelo nº2 do artigo 143º do CPTA, constando de uma enumeração não taxativa, pois refere “para além de outros a que a lei reconheça tal efeito”.

A regra do nº1 sendo uma regra rígida, é atenuada pelos restantes números do artigo 143º do CPTA sendo possível, que a pedido da parte o tribunal altere o efeito regra dos recursos presente no nº1.

Mas o efeito meramente devolutivo depende da ponderação dos interesses em presença e deve ser recusada quando “os danos que dela resultariam se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua não atribuição2”.

Relativamente ao regime de interposição de recurso, o prazo geral é de 30 dias contados a partir de notificada a decisão recorrida segundo o disposto no nº1 do artigo 144º do CPTA.

Mas há uma exceção a esta regra e consta do prazo para interpor recurso para os processos urgentes, sendo que aí o prazo é de 15 dias3.

Este prazo mais curto justifica-se por ser um recurso com andamento prioritário.

O recurso tem de ser interposto mediante requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão, tendo de ser enunciados os vícios da decisão e respetivas conclusões segundo 
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1 Artigo 141º nº4 do CPTA.

2 Artigo 143º nº5 do CPTA.

3 Artigo 147º nº1 do CPTA.


o artigo 144º nº2 do CPTA. Assim que a secretaria receber o requerimento, ela notifica o recorrido para alegar dentro de 30 dias (artigo 144º nº 3 do CPTA).

No entanto, há um alargamento de prazos quando estiver em discussão a decisão de matéria de facto por via da reapreciação da prova gravada, acrescendo 10 dias ao prazo de recurso segundo o disposto no artigo 144º nº4 do CPTA.

Bem se percebe este alargamento do prazo, permitindo ao mandatário do recorrente que avalie a possibilidade de impugnação da decisão que foi tomada sobre a matéria de facto e que cumpra o ónus de alegação que compete ao recorrente.

Questão complexa é a de saber se este alargamento de prazo faz sentido nos processos urgentes. Esta é uma questão muito debatida, mas a meu ver, independentemente do prazo de interpor recurso nos processos urgentes seja apenas de metade dado o caráter urgente, penso que o alargamento do prazo dos 10 dias não deve ser reduzido, se deve manter ainda assim nos processo urgentes, embora o legislador dá a ideia de ter pretendido a redução dos prazos, ideia essa expressa no artigo 147º nº2 do CPTA, mas embora essa ideia, o legislador ao não fixar um prazo concreto como fez para o recurso nos processos urgentes, deixa margem de arbítrio para interpretação do intérprete. Há que ressalvar, em minha opinião, que o prazo de 10 dias deve manter-se, não só porque não existe nenhuma norma legal que convencione o contrário e por maioria de razão, um prazo ainda mais reduzido para os processos urgentes poderia causar inconveniente, porque o regime está feito para ajudar nos processos urgentes e não para prejudicar.

Se se disser que se viola o que dispõe expressamente o artigo 147º nº2 do CPTA, pode dizer-se que pode haver uma lei especial que refira precisamente o inverso e portanto, o argumento desse artigo para reduzir os prazos a metade acabaria por não se aplicar, dando como exemplo a 1ª parte do nº1 do artigo 143º do CPTA que dispõe “salvo disposto em lei especial”.

Há que atender a situações em que não é admitido recurso, constando do artigo 145º nº2 alíneas a) e b) do CPTA, tendo como consequência o indeferimento do requerimento.

A alínea b) desse artigo tem a particularidade de remeter para o nº4 do artigo 146º do CPTA, o que significa que se o juiz entender que as conclusões do recurso não existem ou são mal formuladas, convidará o recorrente a aperfeiçoá-las. Esta remissão tem como objetivo a admissão da correção ao recurso nos idênticos termos que se admite a sua correção na 2ª instância.

Posto isto, o recurso não pode ser rejeitado ainda que por qualquer motivo não contenha conclusões, tendo de ser dada oportunidade ao recorrente para completar a sua alegação.

Este é o regime que consta igualmente do CPC e inclusive a jurisprudência foi alterando a sua posição, pois inicialmente não era possível, mas com essas sucessivas alterações que foram efetuadas, os recorrentes podem corrigir alguma insuficiência da alegação.      



Recurso de apelação

É um recurso que pretende a reapreciação de uma decisão que ainda não transitou, pretensão essa dirigida a um tribunal de hierarquia superior, com o intuito de revogar ou substituir a decisão tomada em instância inferior, por uma decisão que seja mais favorável a quem recorre (recorrente).

O recurso de apelação é um recurso substantivo, que visa não só a correção do que foi julgado anteriormente, mas também uma pronúncia definitiva sobre a questão de fundo.

O recurso de apelação é um recurso sobre matéria de facto e matéria de direito (artigo 149º nº1 do CPTA). Em regra, o tribunal do recurso deve conhecer do mérito da causa, ainda que declare nula a sentença, evitando baixar o processo à 1ª instância e com isso aplicando o princípio da economia processual. Este recurso é interposto para o Tribunal Central Administrativo para que este julgue de novo o mérito da causa e se este o julgar procedente substitui a decisão recorrida por uma nova decisão, podendo existir novos meios de prova (artigo 149º nº1 do CPTA).

Decorre do disposto no nº2 do artigo 149º do CPTA em que se o tribunal recorrido (1ª instância) tiver “deixado de conhecer certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio”, o tribunal de recurso conhece delas (e não se diz pode conhecer, tem o poder-dever), desde que “nada obsta à apreciação daquelas questões”, o que significa que o tribunal de recurso tem alguma limitação para poder apreciar a questão que veremos seguidamente, embora seja entendimento do STA que “um acórdão do TCA incorria em omissão de pronúncia por ter deixado de se pronunciar sobre questão que o tribunal de primeira instância não tinha chegado a apreciar, quando a análise dessa questão se tornou necessária por efeito da decisão revogatória operada no recurso de apelação (acórdãos de 22 de março de 2011, Processo n.º 916/10, e de 29 de maio de 2014, Processo n.º 502/12)4”.

As razões que podem levar a que o tribunal de 2ª instância não possa conhecer dessas questões, são casos muito particulares, tais como, nos casos da instância ter sido incorretamente constituída e nesse caso o processo terá de ser remetido à 1ª instância, e o caso de que o conhecimento do mérito da causa em 2ª instância está dependente da aplicabilidade do regime “quanto à instrução, discussão, alegações e julgamento em primeira instância5”.

Tudo isto condiciona a ação do tribunal de recurso, podendo remeter-se para o artigo 90º e seguintes do CPTA.

Se todas estas disposições não forem suficientes para a pronúncia, então não haverá conhecimento do mérito da causa em 2ª instância.

Embora estas especificidades, tudo isto não obsta a que se algumas questões não forem conhecidas em 1ª instância, que o tribunal de 2ª instância não as possa conhecer realizando para isso a produção de prova. 

Se em 1ª instância não existir pronúncia de mérito e se conclua que não há fundamento para o não conhecimento, o tribunal de recurso deve conhecer esses pedidos, tal como decorre do disposto no nº3 do artigo 149º do CPTA. A intervenção da 2ª instância tem de contemplar a pronúncia dos interessados para que seja exercido o contraditório, existindo dois momentos relevantes para a audição; são eles o descrito no nº4 do artigo 149º do CPTA, tendo as partes 5 dias para se pronunciarem sobre os meios de prova a produzir; e o disposto no nº5 do artigo 149º do CPTA tendo as partes 10 dias para exercer o contraditório sobre as questões de fundo.

O tribunal de 2ª instância não está inibido de determinar nova produção de prova se tiver dúvidas sobre a prova que foi produzida em 1ª instância, enquadrando-se no artigo 149º nº1 do CPTA, quanto à matéria de facto, pelos poderes que lhe são conferidos.

Quanto à questão de novos vícios, coloca-se a questão se os vícios podem ser invocados em sede de recurso. Cumpre estabelecer que se a 1ª instância conheceu do mérito da causa e se pronunciou há uma limitação na 2ª instância.

Se por outro lado, em 1ª instância não houve pronúncia sobre o mérito da causa e o tribunal de recurso possa conhecer esse mérito ( artigo 149º nº 3 do CPTA), esta questão é remetida para o regime descrito no nº4 do artigo 149º do CPTA relativo “à instrução, discussão, alegações e julgamento em primeira instância”, não havendo entrave a que haja lugar à apreciação de novos vícios que decorram, embora tenha de ser preenchido o requisito de que o conhecimento dos factos advenha da superveniência dos mesmos.  

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4 Mário Aroso de Almeida/Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao código de processo nos tribunais administrativos, 2ª edição, 2016, p. 1136. 

5 Artigo 149º nº 4 in fine do CPTA.


No entanto, para que seja admissível recurso para um tribunal hierarquicamente superior é necessário que o valor da causa seja superior à alçada do tribunal do qual se recorre (artigo 142º nº1 do CPTA). Esta é igualmente a ideia expressa na lei processual civil (artigo 629º nº1 do CPC).

À semelhança de processo civil, o CPTA consagra “uma regra que associa a admissibilidade de recurso de apelação das decisões proferidas em primeiro grau de jurisdição ao valor da causa, que deve ser reportado ao valor da alçada do tribunal que proferiu a decisão6”.

Esta ideia está presente no artigo 6º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), que prevê a existência de alçadas, o que reveste uma grande importância e leva a que seja obrigatória a indicação do valor da causa na petição inicial tal como dispõe o artigo 31º nº1 do CPTA e o artigo 78º nº2 alínea h) do CPTA, podendo assim determinar se admite recurso da sentença proferida em 1ª instância.

Cabe referir que há casos em que o STA e o TCA têm alçada correspondente ao dos TAC, sendo coincidente com os tribunais de 1ª instância judiciais, em que o valor é de 5000 euros. Portanto, há sempre lugar a recurso independentemente do tribunal que tiver proferido a decisão de mérito, se ao valor da causa corresponder o valor de 5000 euros ou valor superior, atendendo ao valor da causa e ao valor da sucumbência, sendo o valor da sucumbência o “montante do prejuízo que a decisão recorrida importa para o recorrente, aferido pelo teor da alegação do recurso e pela pretensão nele formulada, equivalendo, pois, ao valor do recurso, traduzido na utilidade económica que, através dele, se pretende obter7”.

Posto isto, em regra não pode haver recurso das decisões que sejam proferidas em 1ª instância em processos cujo valor seja inferior aos 5000 euros.

A causa deve ter um valor certo (artigo 31º nº1 do CPTA), mas pode igualmente ter um valor indeterminável e nesse caso considera-se que sendo o valor indeterminável ele é superior ao valor da alçada do tribunal de 2ª instância (superior ao valor da alçada do TCA), o que releva, pois, sendo superior ao valor da alçada do TCA é uma causa que admite recurso para o STA.

Mas há casos em que, independentemente do valor da causa e do valor da sucumbência, é sempre possível haver recurso, consubstanciando uma exceção ao referido anteriormente e que constam do disposto no nº3 do artigo 142º do CPTA.



Recursos de revista

Os recursos de revista estão presentes nos artigos 150º e 151º do CPTA e são constituídos por duas modalidades: um recurso de revista de decisões proferidas em 2ª instância que se encontra no artigo 150º do CPTA possibilitando um duplo grau de recurso e um recurso de revista per saltum de decisões proferidas por tribunais de 1ª instância segundo o disposto no artigo 151º do CPTA.

É de salientar que contrariamente aos recursos de apelação que versam sobre matéria de facto e de direito, os recursos de revista versam somente sobre matéria de direito permitindo ao STA analisar de forma discricionária, não estando condicionado pela decisão proferida na instância inferior, sendo que todos os recursos que lhe sejam solicitados são analisados por 3 juízes.

O recurso de revista é um recurso excecional dentro dos recursos ordinários, sendo o

recurso de apelação o recurso regra, pois de um modo geral os recursos seguem a tramitação de recurso de apelação.

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6 Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, 2ª ed., Almedina, 2016, p.406.

7 http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/Administrativo_fiscal/eb_Direito_Processo_Administrativo.pdf


Recurso de revista

Presente no artigo 150º do CPTA e prevê a possibilidade de recurso de revista das decisões proferidas pelos tribunais de 2ª instância (TCA) admitindo um duplo grau de recurso, que se concretiza no recurso efetuado da 1ª instância para a 2ª instância e igualmente recurso da 2ª instância para o STA. Em princípio os recursos que a 2ª instância profere em sede de recurso de apelação não cabe recurso de revista para o STA, no entanto, o artigo 150º nº1 do CPTA admite que a título excecional esse recurso de revista seja admitido. Este recurso é admitido segundo uma valoração qualitativa pois estão em causa questões de “relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”. Todo este procedimento, serve em regra de orientação para os tribunais inferiores.

Por maioria de razão, para poder haver recurso para o STA, deverá o valor da causa exceder a alçada dos tribunais de 2ª instância.

A revista é admitida tendo como fundamento a violação de lei substantiva ou processual (artigo 150º nº2 do CPTA).

O recurso de revista tem algumas especificidades, podendo o ordenar a baixa do processo quando seja necessário ampliar a matéria de facto aplicando as regras do CPC presentes nos artigos 682º nº3, 683º nº1 e 684º nº2 do CPC, pois o CPTA não contém referências específicas nesse campo.

Dado que o STA não julga matéria de facto, limitando-se a aplicar o direito aos factos fixados pelo tribunal recorrido, daí a necessidade de remeter o processo à instância inferior para alterar a matéria de facto.

O STA aplica de forma definitiva o regime jurídico que considere adequado perante os factos fixados pelo tribunal recorrido, pois o STA trata somente sobre matéria de direito.

A ideia expressa no nº4 do artigo 150º do CPTA é de que mais uma vez o STA não tem poderes para modificar a matéria de facto, podendo, no entanto, intervir com vista ao apuramento dos factos que sejam relevantes quando haja um erro na apreciação das provas ou na fixação dos factos materiais. Decorre do artigo 150º nº4 do CPTA que a validade da decisão sobre a matéria de facto pode ser questionada e se isso acontecer o processo baixa à 2ª instância para alteração da matéria de facto.

Cabe ao STA avaliar se deve ou não admitir o recurso, tendo de preencher requisitos, tais como, questões fundamentais ou que sejam necessárias para uma melhor aplicação do direito como decorre do nº1 do artigo 150º do CPTA.

A atribuição dessa avaliação cabe a 3 juízes dos mais antigos da secção de contencioso administrativo, pois estes é que vão determinar se é admitido o recurso ou não e da decisão dos 3 juízes não cabe recurso, cabendo apenas a impugnação perante o Pleno da secção. Sendo assim, “a decisão de admissão ou não admissão do recurso é definitiva8”.

O papel do STA serve de regulador do sistema julgando as causas mais importantes, sendo a última instância e a mais competente para analisar as questões, dado que nenhuma outra instância é constituída por 3 juízes, que funcionam como que um coletivo nos tribunais judiciais quando os processos são complexos, servindo de uma maior segurança para que sejam evitados erros.

No entanto, a necessidade de intervenção do STA tem de ser marcada por um interesse que seja mais do que o interesse individual das partes, tendo de ser marcada por uma utilidade que releve socialmente para que haja uma melhor aplicação do direito.

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8 Mário Aroso de Almeida/Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao código de processo nos tribunais administrativos, 2ª edição, 2016, p. 1156. 


O recurso de revista deve funcionar como um recurso de segurança do sistema e as questões ao STA remetidas devem revestir relevância prática.



Revista per saltum para o Supremo Tribunal Administrativo

O recurso de revista per saltum estão presentes no artigo 151º do CPTA e consistem em recorrer da 1ª instância para o STA e daí a qualificação de “per saltum” porque não passa pela 2ª instância, decorre diretamente da 1ª instância para o STA e tal como o recurso de revista versa igual e unicamente sobre questões de direito.

Para que se possa recorrer ao STA terão de estar preenchidos alguns requisitos, a saber:

- Tratam de questões de mérito (artigo 151º nº1 do CPTA).

- As partes apenas podem suscitar questões de direito (artigo 151º nº1 do CPTA).

- O valor da causa tem de ser superior a 500.000 euros ou ser indeterminável (artigo 151º nº1 do CPTA).

- O processo não pode respeitar a atos administrativos sobre questões de emprego público ou de segurança social (artigo 151º nº2 CPTA).



Preenchidos estes requisitos pode haver recurso de revista per saltum, quando a matéria de facto não suscita controvérsia entre as partes. Se a matéria de facto suscitar controvérsia entre as partes, o processo baixa ao TCA para que o recurso aí seja julgado como apelação (artigo 151º nº4 do CPTA), discutindo-se matéria de facto e de direito tal como consta do artigo 149º nº1 do CPTA.

Nestes casos o recurso é interposto por meio de requerimento que é a regra para os recursos, presente no artigo 144º nº2 do CPTA.       

Mesmo que o recorrente não indique a espécie de recurso no seu requerimento o juiz tem o dever de o fazer seguir como recurso per saltum.

A decisão do relator que não admita recurso é definitiva não podendo ser objeto de impugnação (artigo 151º nº4 do CPTA).

No entanto, no nº5, pelo contrário “se o relator admitir o recurso poderá haver reclamação para a conferência”.

Como se percebe esta decisão, pois se as questões ultrapassarem o âmbito da revista, como por exemplo, tendo de ser analisadas questões de facto, entende-se o porquê de o STA não admita o recurso, porque os recursos de revista só versam sobre matéria de direito e não matéria de facto.



Conclusão

Para concluir perante o exposto anteriormente, verifica-se que a matéria de recursos é complexa, para cada tipo de recursos há especificidades únicas, embora haja a parte geral que se aplique a todos os tipos de recursos. Constata-se igualmente que se aplicam muitas disposições do CPC, embora a título subsidiário, pois o CPTA não contempla todas as questões sobre a matéria.

Serve este trabalho para refletir sobre as questões de recursos, embora muito mais haveria a referir e a refletir, pois é uma matéria que está desenvolvida mas, talvez, não o suficiente, carecendo de uma maior e mais vasta abordagem, com pontos de vista diferenciados.

No entanto, há que referir que esta abordagem serve para ilustrar a complexidade da matéria e que muito mais haverá a desenvolver.













Bibliografia: 



Livros:

José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, 14ªedição, Almedina, 2015



Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, 2ª ed., Almedina, 2016



Mário Aroso de Almeida/Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao código de processo nos tribunais administrativos, 2ª edição, 2016





Sites consultados: http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/Administrativo_fiscal/eb_Direito_Processo_Administrativo.pdf

 http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/Administrativo_fiscal/eb_RevisaoCPTA_I.pdf






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