domingo, 4 de novembro de 2018

Os Processos Urgentes no Contencioso Administrativo: Intimações


Intimações


O processo declarativo comum do contencioso administrativo é o modelo geral aplicado na generalidade dos casos. O CPTA prevê os processos urgentes para as situações em que é necessário obter com urgência uma decisão de mérito da causa. O CPTA dá ao título III o nome de “processos urgentes” em que as formas especiais de processo nele previstas são de forma a que o processo seja mais célere, devido à urgência das situações, estas formas de processos são qualificadas no artigo 36º CPTA.                                                      
São cinco os tipos de processo urgentes que se encontram previstos no CPTA: procedimentos de massa, artigo 99º, os atos praticados no âmbito de certos tipos de contratos, artigos 100 a 103-B, os pedidos de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, artigos 104º a 108º e para a proteção dos direitos, liberdades e garantias, artigos 109º a 111º. Para além destes à também processos urgentes previstos em legislação especial.
Para efeitos de ser aplicável o regime dos artigos 36º nº 2, segundo o qual os processos urgentes correm mesmo em férias com dispensa de vistos prévios, mesmo em fase de recurso jurisdicional e os atos da secretaria são praticados no próprio dia com precedência sobre quaisquer outros. O artigo 147º nº 1 CPTA consagra que nos processos urgentes, os recurso são interpostos no prazo de quinze dias e sobem imediatamente no processo principal ou em separado o caso contrários, de acordo com o nº 2 do mesmo artigo, os prazos a observar durante o recurso são reduzidos a metade e o julgamento pelo tribunal superior tem lugar, com prioridade sobre os demais processos na sessão imediata à conclusão do processo para decisão.    
Neste trabalho iremos desenvolver as intimações. Segundo Mário Aroso de Almeida “pode dizer-se que os processos de intimação são processos urgentes que se caracterizam por se dirigirem à emissão de uma imposição, pretendendo-se, com esta expressão, qualificar uma pronúncia de condenação que, com carácter de urgência, é proferida no âmbito de um processo de cognição sumária”. 1 As intimações são processos urgentes de condenação, que visam por imposição judicial a adoção de comportamentos e a prática de atos administrativos. Há dois tipos de intimações previstos no CPTA. As intimações para a prestação de informações, consulta de processos e passagens de certidões e as intimações para proteção de direitos, liberdades e garantias. O legislador tem desde há anos, instituindo, em diversos domínios, processos especiais com carácter urgente, concebidos para intimar a administração à prática do ato legalmente devido, o título III limita-se a prever e regular os principais processos urgentes do contencioso administrativo, não excluindo a existência de quaisquer outros que possam ser consagrados em legislação especial.




Intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões


O primeiro processo de intimação regulado no CPTA é a intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões previsto nos artigos 104º a 108 CPTA.  Este processo tanto pode ser um processo autónomo como um processo acessório como está previsto nos artigos 60º e 106º. A intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões foi instituído em 2002 e veio após a “intimação para consulta de documentos ou passagem de certidões” destinado à obtenção de dados necessários para a impugnação. Havia sobre este método querelas doutrinárias acerca e era um meio acessório ou autónomo, embora na lei fosse consagrado como um meio acessório. Houve uma evolução e a intimação para prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões está agora consagrado como um meio autónomo, embora ainda possa ser utilizado de forma acessória.  
O artigo 107º CPTA estabelece a forma de tramitação destas intimações. O regime desta tramitação é o de que uma vez recebido o requerimento de intimação apresentado pelo autor, a secretaria promove a citação da entidade demandada, que tem um prazo de dez dias para responder. Uma vez apresentada a resposta ou decorrido o prazo respetivo, segue-se a decisão do juiz, a não ser que o juiz considere necessário a realização de diligências complementares. A celeridade do processo é assegurada pela aplicação do regime dos processos urgentes, previstos nos artigos 36º nº 2 e 3 e 147º CPTA.   
Por vezes a intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões é utilizada não em razão de urgência no uso deste meio processual, mas sim para a obtenção de informações. Quanto à legitimidade a intimação pode ser pedida pelo Ministério Publico, para o exercício da ação pública, artigo 104º, nº 2 CPTA, por titulares de direitos de informação Quanto à legitimidade passiva, tem legitimidade a pessoa coletiva ou ministério a que pertence o órgão em falta, artigo 10º, nº2. Os requisitos substâncias constam da lei, fazendo ressalva aos segredos públicos e privados. A utilização deste meio pressupõe o incumprimento da administração do dever de informar. O prazo é de 20 dias, a partir da omissão do indeferimento ou do deferimento parcial da administração, artigo 105º CPTA. Tem o prazo de dez dias e a decisão do juiz, em regra, demora cinco dias, artigo 107 CPTA. Se a decisão for condenatória, o juiz deve fixar o prazo de dez dias para o cumprimento da intimação, podendo ser aplicadas sanções pecuniárias compulsórias, se não houver justificação atendível para o incumprimento, artigo 108º nº2 CPTA.

Intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias


Uma das novidades introduzidas pela reforma do contencioso administrativo foi o destaque à tutela principal urgente dada no título III em especial às intimações dos direitos, liberdades e garantias. Na discussão pública do anteprojeto reiterou-se a necessidade de criar um processo para a tramitação da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias.
Quanto ao regime estabelecido para a tramitação da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias foi dito na proposta de lei que esteve na origem do CPTA que a intimação é "um instrumento que se procurou desenhar com uma grande elasticidade, que o juiz deve dosear em função da intensidade da urgência" . Tendo vários níveis conforme a urgência no caso concreto.
Nas situações de urgência normal em que o processo segue o artigo 110º nº 1 e que apresenta uma complexidade de apreciação normal. Nos processos desencadeados em situações de urgência norma, mas cuja apreciação reveste de uma complexidade fora do normal, artigo 110º nº 2 aplica-se o modelo da ação administrativa, artigos 78º e seguintes CPTA, ainda que com prazos reduzidos a metade. Há também processos desencadeados em situações de extrema urgência, artigo 110º nº3, alínea a) que são mais rápidos que o normal e segundo o artigo 110º nº 3, alínea b) segue termos informais muito simplificados com vista à celeridade. Este meio processual tem como fundamento o artigo 20º, nº 5 da CRP “Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efetiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.”.  
A utilização desta ação deve, no entanto, limitar-se às situações em que esteja em causa direta e imediatamente o exercício do próprio direito, liberdade ou garantia. Não é legitima a extensão da intimação para a proteção de eventuais interesses substanciais ou procedimentais que tenham uma ligação meramente instrumental com a realização de direitos constitucionais ou constituam concretizações legislativas de direitos fundamentais de conteúdo insuscetível de determinação no plano constitucional.2 Contrariamente a esta opinião Jorge Reis Novais considera que, para efeitos de intimação, considera como direitos, liberdades e garantias  os direitos que resultam da concretização por lei ordinária de direitos fundamentais sociais.3  
Os pressupostos para a intimação são em primeiro lugar a urgência da decisão para evitar a lesão dos direitos. Esta urgência tem um grau gradativo que difere de caso para caso e deve ser avaliada pelo juiz. Para utilizar a intimação é necessário que não seja possível ou suficiente o decretamento de uma providência cautelar. Este é o único processo principal urgente que exige, de facto, uma urgência concreta. Outro pressuposto para além de não ser possível o decretamento de uma providência cautelar é a indispensabilidade da intimação, ou seja, é o requerente da intimação que tem de provar que só a procedência da intimação levará à plenitude do exercício do seu direito.
A legitimidade para utilizar a intimação pertence aos titulares de direitos, liberdades e garantias, embora se possa incluir a ação popular realizada pelo Ministério Público. Segundo Carla Amado é parte legitima “todo aquele que alegar e provar sumariamente a ameaça de lesão (ou início de lesão) de um direito, liberdade ou garantia através de uma ação ou omissão”.4 
A legitimidade passiva a intimação pode ser requerida quanto à administração ou contra outras entidades que exerçam funções materialmente administrativas, artigo 109º CPTA.  A legitimidade passiva pertence ao órgão que esteja a por em causa o exercício de um direito, liberdade e garantia e salvo especial urgência o particular pode ser demandado subsidiariamente em relação à Administração. Quanto à legitimidade passiva aplicam-se as regras do artigo 10º CPTA.                                                                                                                 
O conteúdo do pedido será a condenação por parte da administração pública da adoção de uma conduta ou prática de um ato administrativo, como está disposto no artigo 109º, nº 1 e 3.   A estas intimações prevêem-se as regras gerais de execução de sentenças condenatórias, incluindo as relativas à responsabilidade civil. Tal como na intimação para a prestação de informações, obtenção de processos e passagem de certidões, o juiz também pode fixar sanções pecuniárias compulsórias. 
As decisões de improcedência de pedidos de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias são sempre recorríveis seja qual for o valor da causa, artigo 142º nº3, alínea a), devido aos direitos constitucionais a serem assegurados. O recurso será interposto para o Tribunal Central Administrativo, artigo 37º, alínea a) do ETAF. Os recursos de intimação tem efeito meramente devolutivo, artigo 143º, nº2, alínea a) CPTA, e destina-se a salvaguardar a utilidade da decisão. Os processos urgentes são interpostos no prazo de 15 dias e sobem imediatamente, artigo 147º, nº1. Os prazos do recurso são reduzidos a metade e o julgamento tem prioridade sobre os outros, artigo 147º, nº 2.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   Rafaela Cristina Batista da Silva, nº 26260

  _________________________________________________
            1 Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, editora Almedina, pág. 399.
2 José Carlos Vieira de Andrade, A justiça Administrativa, pág. 321
3 Jorge Reis Novais, Direito, liberdade e garantia: Uma noção constitucional imprestável na justiça Administrativa, 2009, pág. 48 e ss.
4 Carla Amado, Contexto, pretexto e texto da intimação para a proteção de direitos, liberdades e garantias, pág. 562.


Bibliografia:
  • Almeida, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, editora Almedina, 2017, 3ª edição.
  • Firmino, Ana Sofia, Novas e Velhas Andanças do Contencioso Administrativo-Estudos sobre reforma do processo administrativo, Almedina, 2005.
  • Carla Amado, Pretexto, Contexto e Texto da Intimação para a proteção de direitos, liberdades e garantias, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Teles, vol. V, 2003.
  • Andrade, José Carlos Vieira de, A Justiça Administrativa, editora Almedina, 2015, 14ª edição.
                            
                                                   
 
      

             
 
      
 
                                                                                              

Sem comentários:

Enviar um comentário