domingo, 4 de novembro de 2018




O princípio Pro Actione no centro das reformas do Contencioso Administrativo

O princípio Pro Actione encontra-se consagrado no artigo 7º do código do Processo dos Tribunais Administrativos e podemos encontrá-lo sobre o nome de “Promoção do acesso á Justiça”. Este artigo dispõe:

“Artigo 7.º
Promoção do acesso à justiça

Para efetivação do direito de acesso à justiça, as normas processuais devem ser interpretadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formuladas.”


O princípio pro actione pretende então evitar que seja negado o acesso á justiça pelo excesso de formalismos que são requeridos e não executados pelas partes, e pretende faze-lo ao incentivar a interpretação e aplicação das normas de base processual. É ainda uma concretização do princípio constitucional do acesso efetivo á justiça administrativa, previsto no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, que aponta para uma interpretação e aplicação das normas processuais no sentido de favorecer o acesso ao tribunal ou de evitar as situações de denegação de justiça, designadamente pelo excesso de formalismos.1
De acordo com Mário Aroso e Carlos Cadilha, o princípio pro actione, impõe que em situações duvidosas, a interpretação das normas seja efetuada no sentido de promover a emissão de uma decisão de mérito.2
Em relação á reforma de 2002/2004, um dos seus princípios nucleares foi o princípio da Tutela Judicial Efetiva, que tem expressão em inúmeras soluções que visam evitar a realização de decisões formais injustificadas. Como referido anteriormente, um dos corolários deste princípio é o principio Pro Actione, que favorece a tomada de decisões de mérito em detrimento de questões de outra natureza, ora a aplicação deste principio proveniente do processo civil, ao procedimento administrativo, veio impedir que a administração se ocupe de questões de natureza meramente formal em detrimento da posição jurídica material dos administrados. É apenas nos casos de “in dúbio”             que está em causa a aplicação deste principio, visto que resulta do artigo 7º que a interpretação ou integração das normas processuais no sentido mais favorável à obtenção de uma decisão de mérito apenas poderá ser feita na condição de a norma suscitar dúvidas quanto à sua interpretação, em relação a este ponto, Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, afirmam que “ao contrário do entendimento tradicional de que estes princípios de “favor” são apenas para aplicar em caso de dúvida, o legislador do CPTA eximiu-se de referir, neste art 7º, que a interpretação das normas processuais em sentido favorável à emissão de uma decisão de mérito só devia ser feita nesse pressuposto, de as normas a aplicar suscitarem duvidas mais ou menos profundas…”.3
O próprio Código do Processo dos Tribunais Administrativos, encontra-se estruturado com base no princípio Pro Actione, que procura conferir uma eficaz e estável tutela jurisdicional dos interesses do lesado.
A plenitude da garantia jurisdicional administrativa não é assegurada apenas com a consagração do direito ao recurso de anulação de atos, mas também com a proteção jurisdicional de posições subjetivas. Este principio privilegia, sempre que se mostre possível, o conhecimento da questão de fundo, o que se pretende é que o juiz tenha uma certa margem de manobra para suprir oficiosamente a falta de pressupostos suscetíveis de sanação, diminuindo assim as absolvições da instancia e favorecendo o processo.
De acordo com Sérvulo Correia4 a ideia que subjaz é a do “favorecimento das tomadas de decisões de mérito, contrariando o excessivo relevo que possam apresentar as questões de outra índole”5.  Convém referir, no entanto, que o princípio do favorecimento do processo não pode prevalecer imperiosamente sobre os demais princípios e regras processuais. Para que tal não suceda, o juiz não deve desconsiderar por completo os pressupostos processuais, assim sendo, o mais importante no que toca ao princípio Pro Actione, é a garantia de uma correta tramitação do processo. A interpretação demasiado formalista dos pressupostos processuais levava os juízes “a valer-se de razões de ordem meramente formal para se subtrair, num número excessivo de situações ao julgamento do mérito das causas”.5
De acordo com o professor Vasco Pereira da Silva é de saudar vivamente, no novo código, a superação do fetiche dos prazos de impugnação, mediante a introdução de mecanismos de flexibilidade da lógica e da irremediabilidade dos prazos, que é um corolário do princípio da justiça material ou Pro Actione. O artigo 58º\4 do Código do Processo dos Tribunais Administrativos, prevê a possibilidade de alargamento do prazo de impugnação até um ano, se existirem motivos relevantes, “caso se demonstre com respeito pelo princípio do contraditório, que no caso concreto, a tempestiva apresentação da petição não era exigível a um cidadão normalmente diligente.6
Por ser uma manifestação do princípio do acesso efetivo á justiças administrativas deverão ser aplicadas, no âmbito do processo, as normas processuais mais favoráveis ao acesso ao tribunal, tal traduz-se no esforço de realizar todos os objetivos tendentes à proteção dos direitos dos particulares sendo que estes não deverão observar um custo desproporcionado.
O artigo 7º do CPTA não permite que o juiz se exonere das responsabilidades de responder sobre o mérito da causa, o que se trata aqui é de favorecimento do processo e não do pedido.
Este princípio demonstra uma inversão da atitude da nossa jurisprudência que se inclinava para uma interpretação dos pressupostos processuais mais formalista, apresenta, portanto, um especial significado para o contencioso administrativo.  Os meios que o legislador colocou á disposição dos interessados no contencioso administrativo resultam de um efeito implacável do tempo processual nas situações da vida dos indivíduos que recorrem á justiça administrativa.

A doutrina já há algum tempo proclamava a necessidade de dotar o contencioso administrativo de mecanismos precisos que oferecem uma tutela mais imediata e atempada, de forma a dar sentido á resolução do litígio.
Como refere o professor Vasco Pereira da Silva, o contencioso administrativo de hoje é o resultado de uma evolução conturbada, “de uma infância difícil”. O artigo 7º CPTA ao consagrar um princípio estruturante, que já há muito era requisitado por quem necessitava de recorrer aos Tribunais Administrativos, e vem proporcionar a sustentabilidade de muitas pretensões apresentadas, que se propostas anteriormente seriam excluídas imediatamente.  



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1 ANDRADE, José Carlos Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, 11º edição Almedina, Coimbra, 2011, pág. 436.
2 ALMEIDA, Mário Arenoso de; CADILHA Carlos, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3º edição Almedina, Coimbra, 2010, pág. 63 e 64.
3 Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e Código de Processo nos Tribunais Administrativos anotado, Vol. I, Almedina, 2004.
4 CORREIA, Sérvulo, Cadernos de Justiça Administrativa, 2004.
5 ALMEIDA, Mário Aroso de o Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2013.
6 O contencioso no Divã da Psicanalise, 2º edição, Almedina, 2008.

  




BIBLIOGRAFIA


·         ANDRADE, José Carlos Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, 11º edição Almedina, Coimbra, 2011.
·         ALMEIDA, Mário Arenoso de; CADILHA Carlos, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3º edição Almedina, Coimbra, 2010.
·         ALMEIDA, Mário Aroso de o Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2013.
·         SILVA, Vasco Pereira da Silva, “O Contencioso Administrativo No Divã Da Psicanalise”, 2º edição, Almedina, 2008.








                                                                                                                     Carolina Rosa
                                                                                                                     4º ano, turma A
                                                                                                                     Nº28239


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