A Responsabilidade
extracontratual como autonomia dos Tribunais Administrativos e do Contencioso
Administrativo
A Constituição da
República Portuguesa (CRP) estatui no seu artigo 22º que o Estado e as
restantes entidades públicas têm imputáveis em responsabilidade civilno caso de
violarem, através da sua ação ou omissão, os direitos, liberdades e garantias
dos cidadãos. A responsabilidade extracontratual do Estado e das de mais
entidades públicas é a manifestação mais pura daquilo que é um Estado de
Direito.
Tal como descreve o
Professor Vasco Pereira da Silva, mesmo após a reforma do contencioso
administrativo português de 2004, esta não foi suficiente para alcançar um
desenvolvimento profundo relativamente à responsabilidade civil pública. Em
2007, surgiu um documento legislador – o Regime Jurídico da Responsabilidade
Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas – mas que, na opinião do
Professor, não foi capaz de “ser coerente com a letra e espírito” da reforma da
Justiça Administrativa.[1]
O Professor Vasco Pereira
da Silva defende ainda que o artigo 38 leva a autonomização do pedido de
indemnização relativamente aos demais pedidos (incluindo o pedido da anulação,
por exemplo). Esta solução viria afastar uma situação que o Professor
consideraria inconstitucional, que consistia na subalternatiziação do direito
fundamental ao direito de indemnização, também inconstitucional. A hipótese
criticada passava pela existência de uma dependência de resposta para se
verificar um dever de indemnizar por parte da Administração, da prévia interposição
pelo particular recurso contencioso de anulação do ato administrativo
ocasionador do dano, tal como foi defendido por Marcello Caetano.
Teremos que saber ao que
é que a Administração fica adstrita numa realidade de responsabilidade
extracontratual. Ora, caso a Administração Pública fique obrigada a reparar
danos que tenha causado, mesmo que venha defender-se com a falta deste dever, o
Estado ou qualquer outra entidade pública ficará condenado a realizar
prestações com o intuito de reparar os danos causados.
No caso da Administração
ter inserido na ordem jurídica, atos que violem a esfera jurídica dos
particulares, o artigo 50, nº3, CPTA, é claro na resposta que deve ser dada.
Ainda que haja uma interrupção do prazo da prescrição do direito à reparação
dos danos, esta reparação nunca deixa de existir. O CPTA não deixa de
reconhecer que a impugnação do ato administrativo lesivo é um instrumento
dirigido a fazer cessar a situação lesiva.[2]
Compete à jurisdição
administrativa apreciar toda e qualquer questão de responsabilidade civil
extracontratual emergente da conduta da Administração Pública, nos termos do
artigo 4, nº1, alínea f), ETAF. Cabe aos todos os tribunais administrativos uma
competência genérica para apreciar todas as questões de responsabilidade civil
extracontratual do Estado e outras entidades públicas.
O Professor Mário Aroso
de Almeida, conclui que é ainda necessário a distinção entre a atuação de
gestão pública e atuação de gestão privada. Esta necessidade prende-se com o
facto de a lei conferir titularidade de prerrogativas de poder público ou cuja
atividade desenvolvida seja regulada por direito administrativo a entidades
privadas.
Se no passado a
prevalência dos interesses da Administração era bastante visível na sua quer na
sua atuação quer nos tribunais, atualmente verifica-se o contrário. Esta
mudança de paradigma deve-se a vários fatores que, todavia, partilham uma base
comum: o Estado de Direito. Ainda que se queira individualizar a autonomia dos
tribunais administrativos e tributários como causa da igualdade de estatuto
entre a Administração e os particulares, na minha opinião, essa equiparação
sucede com o surgimento do Estado de Direito. É verdade que a autonomia dos
tribunais foi um passo essencial para o Contencioso Administrativo, mas é o
constituição de um Estado de Direito, que protege os particulares, colocando-os
no mesmo patamar da Administração, no âmbito do processo administrativo, no
decorrer de um litigio onde o particular viu o seu direito a ser violado e que
pretende a reparação dos danos causa pela conduta ou omissão de uma entidade
pública.
Tiago Coluna Nº 26241 - Subturma 8
[1] Vasco
Pereira da Silva, “O Contencioso Administrativo do Divã da Psicanalise”, 2014
[2] Mário
Aroso de Almeida, “Manual de Processo Administrativo”, 2017
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