sábado, 3 de novembro de 2018

A Responsabilidade extracontratual como autonomia dos Tribunais Administrativos e do Contencioso Administrativo


A Responsabilidade extracontratual como autonomia dos Tribunais Administrativos e do Contencioso Administrativo

A Constituição da República Portuguesa (CRP) estatui no seu artigo 22º que o Estado e as restantes entidades públicas têm imputáveis em responsabilidade civilno caso de violarem, através da sua ação ou omissão, os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. A responsabilidade extracontratual do Estado e das de mais entidades públicas é a manifestação mais pura daquilo que é um Estado de Direito.

Tal como descreve o Professor Vasco Pereira da Silva, mesmo após a reforma do contencioso administrativo português de 2004, esta não foi suficiente para alcançar um desenvolvimento profundo relativamente à responsabilidade civil pública. Em 2007, surgiu um documento legislador – o Regime Jurídico da Responsabilidade Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas – mas que, na opinião do Professor, não foi capaz de “ser coerente com a letra e espírito” da reforma da Justiça Administrativa.[1]

O Professor Vasco Pereira da Silva defende ainda que o artigo 38 leva a autonomização do pedido de indemnização relativamente aos demais pedidos (incluindo o pedido da anulação, por exemplo). Esta solução viria afastar uma situação que o Professor consideraria inconstitucional, que consistia na subalternatiziação do direito fundamental ao direito de indemnização, também inconstitucional. A hipótese criticada passava pela existência de uma dependência de resposta para se verificar um dever de indemnizar por parte da Administração, da prévia interposição pelo particular recurso contencioso de anulação do ato administrativo ocasionador do dano, tal como foi defendido por Marcello Caetano.

Teremos que saber ao que é que a Administração fica adstrita numa realidade de responsabilidade extracontratual. Ora, caso a Administração Pública fique obrigada a reparar danos que tenha causado, mesmo que venha defender-se com a falta deste dever, o Estado ou qualquer outra entidade pública ficará condenado a realizar prestações com o intuito de reparar os danos causados.
No caso da Administração ter inserido na ordem jurídica, atos que violem a esfera jurídica dos particulares, o artigo 50, nº3, CPTA, é claro na resposta que deve ser dada. Ainda que haja uma interrupção do prazo da prescrição do direito à reparação dos danos, esta reparação nunca deixa de existir. O CPTA não deixa de reconhecer que a impugnação do ato administrativo lesivo é um instrumento dirigido a fazer cessar a situação lesiva.[2]

Compete à jurisdição administrativa apreciar toda e qualquer questão de responsabilidade civil extracontratual emergente da conduta da Administração Pública, nos termos do artigo 4, nº1, alínea f), ETAF. Cabe aos todos os tribunais administrativos uma competência genérica para apreciar todas as questões de responsabilidade civil extracontratual do Estado e outras entidades públicas.
O Professor Mário Aroso de Almeida, conclui que é ainda necessário a distinção entre a atuação de gestão pública e atuação de gestão privada. Esta necessidade prende-se com o facto de a lei conferir titularidade de prerrogativas de poder público ou cuja atividade desenvolvida seja regulada por direito administrativo a entidades privadas.

Se no passado a prevalência dos interesses da Administração era bastante visível na sua quer na sua atuação quer nos tribunais, atualmente verifica-se o contrário. Esta mudança de paradigma deve-se a vários fatores que, todavia, partilham uma base comum: o Estado de Direito. Ainda que se queira individualizar a autonomia dos tribunais administrativos e tributários como causa da igualdade de estatuto entre a Administração e os particulares, na minha opinião, essa equiparação sucede com o surgimento do Estado de Direito. É verdade que a autonomia dos tribunais foi um passo essencial para o Contencioso Administrativo, mas é o constituição de um Estado de Direito, que protege os particulares, colocando-os no mesmo patamar da Administração, no âmbito do processo administrativo, no decorrer de um litigio onde o particular viu o seu direito a ser violado e que pretende a reparação dos danos causa pela conduta ou omissão de uma entidade pública.


Tiago Coluna Nº 26241 - Subturma 8


[1] Vasco Pereira da Silva, “O Contencioso Administrativo do Divã da Psicanalise”, 2014
[2] Mário Aroso de Almeida, “Manual de Processo Administrativo”, 2017

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